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todos os agradecimentos à Laura Pimenta
e ao Mathieu Morhain
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Um estado totalitário
realmente eficiente seria aquele em que o todo-poderoso executivo,
feito de chefes políticos e o seu exército de gestores,
controla uma população de escravos que não
tem de ser coagida, porque adoram a sua servidão.
Aldous Huxley, Admirável Mundo Novo
Quando Gregor
Samsa acordou numa manhã, depois de sonhos desconfortáveis,
viu-se transformado na sua cama num inseto gigantesco.
Franz Kafka, A Metamorfose
Não vale
a pena voltar ao passado, porque então eu era uma pessoa
diferente.
Lewis Carroll, Alice
São apenas
homens e formigas. São as formigas que constroem as suas
cidades, vivem as suas vidas, têm guerras, revoluções,
até que os homens as queiram fora do caminho, e então
saem do caminho. Isso é o que somos agora - apenas formigas.
H. G. Wells
Estaremos todos nos
tornando insetos à escala planetária como parte
da Nova Ordem Mundial? Estaremos nos confortando cada vez mais
com comportamentos ditados pelo mundo do consumo, do entretenimento
e da manipulação, com uma vida sem questionamentos,
sem crítica?
Estarão condenados os livros, as obras de arte (não
de ilustração, decoração ou entretenimento)
e a filosofia graças a uma onda tecnológica que
impõe a exclusão dos mais velhos, das pessoas com
menos formação e dos mais pobres em nome de um
mundo comandado por mecanismos de Inteligência Artificial
em rápida substituição da inteligência
humana?
Estará a democracia condenada? Estaremos destinados a
leis que mudam constantemente de forma a deixar a todos perdidos?
Estará condenada a educação, como instrumento
de iluminação para que cada pessoa possa descobrir
por si mesma a vida? Viveremos em Estados autoritários
que se tornam verdadeiros monstros fiscais, censores e ditadores
comportamentais?
Concerto e filme são uma espécie de partilha de
reflexão onde as suas próprias estruturas são
um olhar crítico sobre o mundo.
Nos primeiros dias de 2022, fui às
Cataratas do Iguaçú, no sul do Brasil. Nunca tinha
ido lá! Trata-se do maior conjunto de cachoeiras do mundo.
As quedas de água chegam a ter quase cem metros.
A Foz do Iguaçú está localizada numa área
da Mata Atlântica. Está, portanto, no meio de uma
grande floresta. A UNESCO descreve a Mata Atlântica como
sendo "uma das sete áreas de floresta úmida
dos Neotrópicos e a segunda maior depois da floresta tropical
amazônica, cobre cerca de 90000 km², ao longo de 3000
km da Costa Atlântica, cobrindo 17 estados brasileiros
diferentes. (...) A Reserva de Biosfera da Mata Atlântica
é um importante foco de biodiversidade. Estima-se que
55% das espécies arbóreas e 39% das espécies
de mamíferos são endêmicas desta região.
É o lar de 15% dos primatas brasileiros, incluindo o mico-leão
dourado (Leontopithecus rosalia), e também onças-pintadas
(Panthera onca)".
Em 1984 compus o meu primeiro concerto dedicado ao John Cage
utilizando sons das florestas brasileiras como instrumentos musicais.
Chamou-se Concerto para Sapos e Grilos.
No ano seguinte, em 1985, utilizando sons de ondas curtas de
rádio emitidas por todo o planeta, captados dentro das
florestas brasileiras, compus Short Waves 1985, que se
tornaria numa das composições musicais de maior
sucesso nas obras coreográficas de Merce Cunningham, com
apresentações em todo o mundo, do Lincoln Center
de Nova Iorque à Opera Bastille de Paris, do La Fenice
de Veneza ao Shinjuku Bunka Center de Tóquio, entre muitos
outros ao longo de mais de trinta anos.
Agora, em 2022, quase quarenta anos depois do Concerto para
Sapos e Grilos, assim que dei os primeiros passos na Mata
Atlântica que abraça a Foz do Iguaçú,
fiquei imediatamente encantado. Os sons dos insetos eram absolutamente
fabulosos!
No dia seguinte, busquei o meu equipamento e gravei aqueles sons
que se tornariam os instrumentos musicais de um novo concerto:
Os Insetos.
Não se trata da utilização pura e simples
das gravações, como acontecia com a música
concreta.
Todos os sons são feitos por insetos, que surpreendentemente
nos levam ao mundo eletrônico.
Várias amostras de sons serviram como base para a elaboração
em laboratório de quinze conjuntos de sons, como micro-composições,
e como se tratássemos, num certo sentido, de quinze instrumentos
musicais.
Esses sons são distribuídos num plano virtual,
dentro de Realidade Virtual. O sentido musical da composição
não está apenas relacionado ao conteúdo
dos sons, àquilo que ouvimos - mas está, principalmente,
na relação entre as suas partes.
Há uma espécie de diagrama de relações
que designa a posição de cada conjunto de som no
tempo e no espaço.
Cada plano foi originalmente desenhado para dois executantes.
E há três diferentes planos possíveis.
Cada executante pode escolher uma das "vozes" num dos
planos.
Cada músico é convidado a transformar livremente,
em tempo-real, aqueles materiais. Assim temos a matriz criada
no laboratório, a partitura determinando a posição
dos sons no espaço e no tempo, e também a interpretação
de cada músico.
Apesar dessa diversidade, a unidade da peça é sempre
assegurada.
A unidade está na relação entre os sons
- que possuem, cada um deles, um "centro" onde a intensidade
é mais forte, e também projeções
de distribuição espacial e de um desenho dinâmico.
Toda a elaboração da composição musical
está baseada nos princípios estéticos Zen,
como tenho feito desde há mais de quarenta anos.
Assim, Os Insetos é um concerto e uma experiência.
Uma viagem. Uma vivência de um mundo que está para
além da nossa escala humana e que é parte essencial
do nosso planeta, de cada um de nós, estando aparentemente
tão distante da nossa dimensão humana.
De forma totalmente independente, também
no ano de 2022, elaborei o filme Os Insetos - que, neste
caso é apresentado em simultâneo com o concerto.
O filme Os Insetos está na fronteira entre o cinema e
a animação.
Ele é uma breve reflexão não-verbal sobre
os nossos comportamentos. Estaremos gradualmente nos tornando
insetos, formigas? Estaremos perdendo a nossa liberdade crítica,
essencial para a compreensão e mudança do mundo?
Isso não significa literalmente mudarmos o mundo, mas
sim mudarmos a nós próprios como parte da contínua
mudança do mundo, através da descoberta, do encantamento.
Teremos a capacidade de manter as nossas competências de
crítica da tecnologia, ou seremos transformados em automatas?
O que seremos hoje?
Já teremos sido definitivamente transformados em insetos?
Essa breve reflexão ao nível não-verbal
que caracteriza o filme-animação, envolve imagens
da história do cinema, da publicidade, da tecnologia,
criando associações que, muitas delas, são
exclusivamente percebidas apenas pela pessoa que o assiste -
pois as imagens são trabalhadas numa dinâmica de
tempo de forma a operar as fronteiras neuronais de percepção
de cada um de nós.
Há ainda citações e referências a
filmes clássicos do início do século XX.
Assim, tal como a música, o filme também é
uma experiência a ser vivida e revivida pelas pessoas.
A versão original tanto do concerto como do filme é
de quarenta minutos.
Emanuel Dimas de Melo Pimenta
Locarno, 2022
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ver ao lado direito os links
para o concerto/filme e para a
partitura musical virtual
Fotos de Emanuel Pimenta, 2022
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emanuel pimenta
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